Como indústria tradicional absorve toda a cevada nacional, única alternativa é comprar malte de outros países
Estimativa é de que existam 300 microcervejarias no Brasil, sendo 80 delas no Rio Grande do SulFoto: Gilmar de Souza / Agência RBS
Em crescimento, o mercado de cervejas artesanais tem na matéria-prima seu maior diferencial e, ao mesmo tempo, grande desafio. Como a produção de cevada é vinculada à indústria, a importação do malte – sujeita à instabilidade cambial e impostos – é a única alternativa para abastecer as cerca de 300 microcervejarias do país, sendo 80 delas no Estado.
Pesquisador da Embrapa Trigo e melhorista de cevada, Euclyes Minella diz que a produção brasileira, da qual o Rio Grande do Sul deve responder por 50% neste ano, tem alta qualidade, mas é insuficiente para suprir a própria demanda da indústria, exigindo importação de cerca de 50% da matéria-prima:
– Esta limitação de cevada, que dá origem ao malte, ocorre diante da competição de preços internacionais e de sazonais frustrações de safra decorrentes do clima, como no ano passado. Há condições de até dobrar a área plantada, mas falta mais garantia de rentabilidade para estimular o setor produtivo.
Uma alternativa para o mercado artesanal driblar a necessidade de importação é a produção independente de malte. Mas aí o desafio é a escala, visto que as microcervejarias usam quantidades pequenas.
Um dos proprietários da Beer Business, que faz consultoria a empresas do ramo artesanal, Edmundo Albers pondera que, para uma maltaria ser viável, teria de processar pelo menos 50 mil toneladas ao ano e, no caso dos maltes especiais – usados em menor proporção nas receitas –, 20 mil toneladas anuais.
– A demanda é menor do que o ponto de equilíbrio necessário. No caso dos maltes especiais, por exemplo, não passa de 6 mil toneladas por ano.
Maltaria independente em Blumenau
Apontada como opção para reduzir preços e facilitar a oferta de matéria-prima, a criação de micromaltarias regionais ainda engatinha, com investimentos isolados como em Blumenau (SC), onde uma unidade para malte especial foi inaugurada recentemente. Para especialistas, porém, este é só o primeiro passo.
– A maioria começa a produzir por paixão, mas é preciso profissionalização para crescer. E ter uma produção nacional de malte valorizaria o agricultor e ajudaria os cervejeiros a obterem preços melhores – diz Filipe Bortolini, produtor de cerveja artesanal e um dos donos da Beer Business.
Diretor da Escola Superior de Cerveja e Malte, de Blumenau (SC), Carlo Enrico Bressiani prevê maior oferta de matéria-prima ao mercado artesanal e cita como exemplo a situação nos Estados Unidos:
– Lá, o mercado cresceu de 1996 a 2002, caiu de 2002 a 2006, ficou estável de 2006 a 2011 e, então, disparou. No Brasil, ainda estamos no primeiro ciclo.
Presidente da Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva), Jorge Gitzler avalia que, apesar dos entraves para matéria-prima, o setor tem crescido ao unir qualidade e um público cada vez mais fiel.
– Hoje, a cerveja produzida no Brasil é tão boa ou melhor do que a de outros países e reconhecida em prêmios internacionais. Têm sabor e história, o que estimula negócios e até o turismo cervejeiro.
Movidos da paixão à profissionalização
Motivados pela oportunidade de criar receitas exclusivas para os mais variados paladares, os cervejeiros artesanais têm buscado qualificação. Em Blumenau (SC), a Escola Superior de Cerveja e Malte já teve mais de mil alunos e, só no curso de férias, em janeiro, foram 117 alunos de 19 Estados.
– Há três perfis dominantes: um focado em produção industrial, outro na produção caseira, e o último para se especializar e atuar em estabelecimentos.
No Rio Grande do Sul, o Sebrae selecionou 36 microcervejarias artesanais para um projeto que busca mapear o setor e estruturar negócios. Presidente da Abracerva, Jorge Gitzler avalia que a alta carta tributária sobre o setor e a necessidade de operações como, por exemplo, comprar matéria-prima importada, são desafios que exigem profissionalização do gestor:
– O custo é alto, os equipamentos são caros, e a qualificação desafia. Logo, estar preparado é tão importante quanto criar uma boa receita de cerveja.
Paralelo a isso, as pesquisas têm crescido. Um dos donos da Beer Business, Filipe Bortolini diz que já há testes experimentais para tentar adaptar o cultivo de lúpulo no Estado e ressalta a importância de parcerias com órgãos de pesquisa para a evolução do setor.
Cerveja de fumo premiada
Com mais de 700 amostras, o 10º Concurso Nacional da Associação dos Cervejeiros Artesanais premiou há duas semanas, em Porto Alegre, as melhores receitas do país.
E teve cerveja para todos os gostos: desde as mais tradicionais até exóticas como a “cerveja de fumo” Franke Bier Virgínia, em que foram usadas folhas de tabaco orgânico. De Santa Cruz do Sul, a bebida foi medalha de bronze na categoria especial.
Saiba mais
— Há quatro matérias-primas básicas para produzir cerveja: malte, lúpulo, água e fermento.
— O fermento já têm opções nacionais, mas não em grande escala.
— Os cervejeiros artesanais têm de importar lúpulo porque o clima não favorece o cultivo no Brasil.
— Quanto ao malte, há necessidade de comprar produtor importado porque toda a cevada nacional é destinada a maltarias atreladas à indústria tradicional de cerveja.
Fonte: Zero Hora
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