Gabriela Montandon, pesquisadora e cervejeira, mostra a levedura nacional que utilizou para a Grimor 18, em maturação na cervejaria (Foto: Divulgação)
Grimor 18 é produzida com levedura nacional, resultado de 4 anos de pesquisa
Por Altair Nobre
Neste momento, matura em um tanque em Nova Lima (MG) uma cerveja que será lembrada na história da (futura) escola cervejeira brasileira. É uma Belgian Blond Ale produzida pela Grimor com levedura nacional, que se contrapõe à dependência da importação vigente hoje no mercado. Deverá estar engarrafada no início da segunda quinzena de agosto, com o nome de Grimor 18. É resultado de quatro anos de pesquisa de uma das proprietárias da cervejaria, a bióloga Gabriela Montandon, em fase de conclusão de doutorado na Bélgica.
A pesquisa para viabilizar a produção de cervejas com leveduras próprias do Brasil foi abordada por Gabriela em texto para a edição 7 da Revista Beer Art, em junho de 2014. Feita quatro vezes de forma experimental no campus europeu, a cerveja agora está tendo as suas primeiras produções em maior escala. Serão duas, cada uma de 2 mil litros. Parte será comercializada, e o restante será destinado à continuidade da pesquisa. "São produções teste em escala industrial, para avaliar a absorção das cervejas no mercado", explica.
A pesquisa ainda é cercada de sigilo, mas Gabriela pode contar alguns detalhes sobre a levedura:
"É fruto de um banco de leveduras. Eu estudei leveduras de vários biomas, de madeira, de vinhos tradicionais, de cachaça. A levedura foi isolada do Brasil e nunca foi usada para a produção da cerveja. Não houve nenhuma modificação genética, o que é proibido para a produção da cerveja."
Para quem ainda está no bê-á-bá do tema, cerveja tem quatro matérias-primas básicas: água, malte, lúpulo e levedura. As duas primeiras produzem o mosto, a essência. Mas, para que essa essência se transforme em cerveja, é preciso fermentá-la, com a ajuda de microorganismos, ou seja, a levedura. A que foi utilizada por Gabriela é uma linhagem da Saccharomyces cerevisae.
"Cada linhagem de levedura metaboliza de uma forma diferente o mosto. Se o cervejeiro separar o mosto e adicionar leveduras diferentes, a bebida terá variações. Nas leveduras que escolhi para estudar, foquei muito no aroma", ressalta Gabriela.
Normalmente, quando se fala em aroma, o apreciador de cerveja artesanal associa ao lúpulo, mas é preciso atentar para o papel da levedura também. "A fermentação é o processo principal para alteração sensorial", diz a cervejeira-pesquisadora, dividida entre a Grimor, o Laboratório de Taxonomia, Biodiversidade e Biotecnologia de Fungos (Departamento de Microbiologia) da Universidade Federal de Minas Gerais e o Laboratory of Enzyme, Fermentation and Brewing Tecnhnology, KU Leuven – Campus Gent na Bélgica.
O próximo passo é licenciar a levedura para a produção em larga escala comercial, que a deixaria mais acessível a todas as cervejarias, e não apenas à Grimor.
O número da cerveja (18) significa a classificação da categoria (Belgian Strong Ale) no guia do Beer Judge Certification Program (BJCP) de 2008, que Gabriela ajudou a traduzir e que serviu para a numeração dos rótulos da cervejaria. Para quem está interessado na possibilidade de adquirir a Grimor 18, embora a produção seja limitada, a intenção da cervejeria é propiciar que o maior número de pessoas provem, em vez de "vender engradados".
O site da Grimor é www.grimor.com.br
Via redes sociais, Gabriela Montandon apresentou a conquista da seguinte forma:
Ligamos o frio, abrimos portas e realizamos um sonho!!
Fermentação acabou, novos ricos aromas povoaram e povoam a cervejaria e agora é hora de maturar a Grimor 18! A Grimor 18 é uma cerveja duplamente “especial” pois é o fruto de um trabalho longo e árduo! Ela foi produzida com uma levedura isolada em território brasileiro, estudada e “certificada” em solo belga e nunca antes utilizada na produção de cerveja!
É o “fim” de um ciclo, que começou há quase 4 anos, quando bati a porta do laboratório do meu orientador Prof. Carlos Rosa, com o sonho de achar uma levedura boa para produção de cervejas especiais em meio aquele vasto banco desse vasto Brasil. Eu era a única a trabalhar com cervejas ali e nas redondezas.
Não tinha onde recorrer mas fui recorrida! Quase que por um acidente, só fui parar na Bélgica por causa da valiosa ajuda (de quem entende mesmo é de lúpulo) do famoso Prof. Denis De Keukeleire. Escolhida a dedo, então fiquei sob a orientação no laboratório de quem sou também eternamente grata, Prof. Guido Aerts, onde realizei quase todo o meu doutorado dentro de um dos melhores laboratório-cervejaria do mundo. De tubos de ensaio e hoje para fermentadores de 2000L…!
Sabe-se lá quais serão os tamanhos dos próximos tanques, mas hoje é um dia que agradeço a todos que me apoiaram, pessoas e instituições envolvidas e toda ajuda e boa energias que recebi de muitas, muitas pessoas que apreciam um trabalho responsável em um meio ainda tão carente!
Muitos são os trabalhos em escala laboratorial, mas testes em escala industrial são raros pois é muito difícil completar o ciclo, seja por tempo, custo e/ou possibilidades. E nós conseguimos! Portanto, mais que nunca, esse momento merece celebração! Em alguns dias finalmente com a própria Grimor 18, uma Belgian-Blond com O toque brasileiro ainda não tão explorado: a nossa tão rica biodiversidade de leveduras! Contaremos ainda mais um pouquinho dessa história! Saúde e Santé!
Fonte: Revista Beer Art
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Ninkasi Beer Club