Luísa João senta o dia inteiro na sombra escassa à beira da estrada nos subúrbios da capital de Angola, Luanda, comprando dólares com uma pilha de kwanzas, a moeda local que ela tira da sua bolsa.
Aos 47 anos, a mãe de três filhos está constantemente atenta às viaturas. Ela é comerciante do mercado paralelo. E as batidas policiais para dissolver o mercado se tornaram mais frequentes desde que a queda da moeda para um mínimo recorde se acelerou no fim do ano passado.
A corrida para venda - que em parte simplesmente reflete o rali mais amplo do dólar frente a moedas do mundo inteiro - também conta com suficientes elementos locais. A dependência do petróleo como fonte de mais de 90% de suas exportações tornou o país vulnerável ao desmoronamento dos preços da commodity, e uma lei de 2012 que exige que as petroleiras estrangeiras paguem a fornecedores e funcionários em kwanzas esgotou ainda mais a oferta de dólares em alguns setores da economia.
No subúrbio de Viana, ao leste de Luana, João observa em primeira mão a crescente escassez de dólares. Para adquirir verdinhas, ela disse que teve que oferecer um prêmio de até 70% frente à cotação do mercado oficial, onde o banco central controla a taxa de câmbio. A especulação de que os responsáveis pela política econômica reduzam a defesa, deixando efetivamente que a moeda despenque frente ao dólar em uma desvalorização, está crescendo.
"Muitas pessoas estão procurando dólares na rua", disse João, olhando de relance a loja de conveniência próxima onde ela esconde seu estoque. "Espero que os negócios voltem ao normal e a polícia nos deixe ganhar o nosso dinheiro".
Cerveja como moeda
Angola, a segunda maior produtora de petróleo da África e a terceira maior economia do continente, está se reconstruindo depois de uma guerra civil de 27 anos que terminou em 2002. No final da década de 1980, quando a inflação disparou e um dólar valia 2.000 kwanzas, os moradores utilizavam cerveja como moeda. Funcionários do governo usavam cupons para comprar cerveja estrangeira, que eles vendiam no mercado negro, e umas poucas caixas bastavam para comprar até uma passagem de avião para Lisboa na empresa aérea estatal subsidiada. A moeda foi revalorizada no fim de 1999, quando seis zeros foram eliminados.
A kwanza se desvalorizou 9,6% nos últimos 12 meses e caiu para o recorde de 108,15 por dólar nesta sexta-feira. No mercado paralelo, a kwanza se depreciou para até 180 por dólar em fevereiro, quando era difícil achar verdinhas, segundo João. Um ano atrás, ela pagava 100 kwanzas por dólar.
A desvalorização da moeda no mercado paralelo sugere que os responsáveis pela política econômica angolana terão que imitar a Nigéria, a maior produtora de petróleo do continente, e desvalorizar sua moeda pelo menos 20%, disse Gareth Brickman, analista de mercado da ETM, em resposta por e-mail a perguntas enviadas neste mês. "Os responsáveis pela política econômica de ambos os países estiveram e estão muito relutantes em se ajustar ao novo statu quo".
Problemas
Uma redução de 25% no gasto do governo está sendo acompanhada por adiamentos em projetos de infraestrutura, e o presidente José Eduardo dos Santos diminuiu as previsões de crescimento do PIB em 2015 de 9,7% para 6,6%. Tiago Dionísio, analista da Eaglestone Advisory SA em Lisboa, é mais pessimista e projeta um crescimento de menos de 4% para este ano. A média de crescimento foi de 10,7% entre 2000 e 2013, segundo a Trading Economics, que compila dados de estatísticas oficias e tem escritórios em Nova York e Lisboa.
Nada disso é um bom presságio para João, a vendedora ilegal de moeda em Viana. Como ela tem problemas para lucrar, ela enfrenta o dilema de ter que escolher entre comprar roupas para seus filhos ou poupar para comprar um gerador que possa manter as luzes acessas durante os blecautes na cidade.
Ter que ler à luz de velas está prejudicando a visão de seus filhos, disse ela.
"Um gerador ajudaria muito."
Fonte: UOL
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